terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Ricardo Setti-Estatuto da Criança e do Adolescente não recupera menores infratores e nem protege a sociedade




Menores infratores: órgãos públicos não cumprem suas obrigações e o Estatuto não funciona (Foto: folhadecampinas.com.br)
Menores infratores: órgãos públicos não cumprem suas obrigações e o Estatuto não funciona (Foto: folhadecampinas.com.br)
Editorial publicado pelo jornal O Globo
O Estado do Rio apreende a cada 60 minutos uma criança ou adolescente por infração criminal.
Ano passado, o número de jovens infratores levados ao Ministério Público ou ao Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Novo Degase), quase 8,4 mil, triplicou em relação a 2010. Levantamento do Novo Degase mostra que a ligação com o tráfico de drogas é responsável por 41% desses recolhimentos; a prática de roubos e furtos, por outros 41%.
Com variações de indicadores e de perfil das infrações, essa é uma realidade que, seguramente, se repete em outros estados.
Em si, são dados assustadores. E eles se agravam ainda mais num país em que vigora uma legislação promulgada com objetivos distintos do que a realidade revela.
Na verdade, está no próprio escopo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) o conjunto de regras que estabelece as relações do Estado e da sociedade com os menores de idade, uma chave, das mais emblemáticas, para desvendar a razão de a curva que registra o envolvimento dos jovens com o crime permanecer em alta exponencial.
Em vigor desde meados de 1990, o ECA foi legado ao país com o ambicioso propósito de ser um instrumento para a proteção integral de crianças e adolescentes. Mas, quase 25 anos depois de criada, a lei revelou-se incapaz de fazer o poder público cumprir obrigações no resguardo de jovens infratores.
E, pelo excesso de paternalismo, tornou-se anteparo para um cada vez maior número de menores de idade que se bandeiam em direção ao crime.
A inócua garantia de proteção e recuperação de menores infratores se reflete no tamanho da leniência do poder público. O artigo 88 do ECA garante a integração operacional de órgãos do Judiciário, do MP, da Defensoria Pública e da Segurança em centros que agilizem o atendimento inicial ao infrator, passo imprescindível para a reinserção social.
Pelo menos no Rio, um quarto de século não foi tempo suficiente para que esse organismo de um mundo ideal saísse do papel.
Já a liberalidade do ECA se mede pelas preocupantes estatísticas de apreensões. O Estatuto é pródigo em listar direitos de menores de idade, mas parco em lhes cobrar responsabilidades. Em razão disso, é cada vez maior o número de jovens menores de 18 anos — mas em idade suficiente para ter consciência de seus atos — que, envolvidos em crimes violentos, ficam inalcançáveis pela Justiça.

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