quinta-feira, 26 de setembro de 2019

LEOCÁDIO


Salta! Pula! A multidão reunida no centro da cidade ansiosa aguardava lá embaixo pelo último ato do suicida. Finalmente ele se jogou do telhado. Os mais sensíveis fecharam os olhos antes do choque fatal. Então antes de espatifar-se no chão Leocádio abriu suas belas asas e alçou voo para navegar sob o resplandecente azul do céu. Antes contornou e fez um rasante mostrando a língua para os abutres que pediam por sangue.

LENO


Leno sempre teimoso, birrento, quebrando regras. Há dez anos passou próximo de um lago e na borda dele havia uma placa- “LAGO CONTAMINADO. PROIBIDO BANHO.” Prato cheio para ele que tirou as roupas e se jogou n’água. Depois disso perdeu o emprego, todos os amigos e amigas, até parentes próximos. Somente os pais o suportam com galhardia. Faz dez anos que Leno cheira a merda.

LÃ E CARNE

Genara era uma ovelha descontente que resolveu fugir dos campos e ir à cidade para cortar sua lã, pois sofria com o calor e principalmente queria ver como era o mundo longe da verde relva. Após muito andar chegou à terra do cimento e aço. Obteve informações e correu até o primeiro barbeiro. Lá chegando perguntou:
-O senhor corta lã de ovelha?
Respondeu o barbeiro um pouco espantado:
-Não só corto a lã como também degusto a carne.  
E dito isso deu uma paulada na ovelha Genara que morreu no ato. O barbeiro foi para casa feliz levando nas costas o futuro assado da noite de seu aniversário.

NÃO SE META


A ponte, o rio veloz lá embaixo, a névoa e o desejo de saltar. O homem salta, bate n’água, um barco que passava salva o suicida. O homem balança a cabeça, abastece de impropérios o pescador que o salvara, fica fora de si; queria mesmo morrer. O pescador não se faz de rogado: sacou do revólver e o matou com dois tiros. Pegou quinze anos por matar um suicida.

MAFIOSO


O verdadeiro mafioso
Vai à igreja e faz carinhos na família
Depois corta um pescoço e não perde o sono.

PERU INÁCIO


Dezembro estava chegando e o peru Inácio não queria morrer. Rezava que rezava para ser poupado nas festas de natal e novo ano. Já não dormia mais, sua angústia era visível. Suas colegas galinhas tentavam consolá-lo dizendo que a vida é mesmo assim; hoje uns e amanhã outros. O galo médico receitou até um ansiolítico. O padre Bode João rogava-lhe que tivesse esperança. Inácio olhava para o ceú azul e não sentia nenhuma alegria, sua única visão era ele bem bronzeado sobre uma farta mesa, rodeado de arroz, saladas e de pessoas embriagadas. O caso é que dezembro chegou e o bom Inácio foi ao forno. Ficou bem moreninho como ele mesmo imaginara; sem dúvida um belo peru. As galinhas amigas agora rezam por sua alma, orientadas pelo Bode João.

TED THOMPSON- BRIGA DE CASAL


Verão, céu azul, sol da tarde quase indo embora. Ted caminhava pela praia de Palmas tomando água de coco, admirando gaivotas, quando observou um casal que chamava a atenção dos presentes pelos gritos e sopapos que trocavam. Alguns estultos pediam mais violência. Ele foi para perto e pediu gentilmente que parassem, no que não foi atendido. Falou para eles que briga de casal deveria ser resolvida entre quatro paredes e não em público, coisa vergonhosa. Foi o que bastou para ser insultado. Como sempre acontece em suas encrencas, tolerância zero. O pau comeu para o casal. Com as mãos espalmadas bateu na face dos briguentos com vontade, deixou suas orelhas vermelhas, deu mais algumas rasteiras, tirou suas roupas, surrou as nádegas e os mandou para casa. Quando alguém disse que iria chamar a polícia por causa da surra ele falou: “Diga antes que quem está aqui é Ted Thompson; eles me conhecem e sabem de que lado estou”.