quinta-feira, 5 de novembro de 2020

METAMORFOSE

 

METAMORFOSE

De férias escolares, Gustavo há dois não dias não saía do quarto, nem para comer. A mãe preocupada chamou que chamou e nada. O pai arrombou a porta, e sobre a cama lá estava ele jogado sobre o travesseiro, iluminado e colorido. Gustavo havia se transformado num smartphone.

H.L. MENCKEN- MULHERES FORA DA LEI - 1921

 

H.L. MENCKEN- MULHERES FORA DA LEI 

Um dos principais encantos da mulher na sociedade humana talvez seja o fato de que elas são relativamente incivilizadas. No cipoal de repressões e inibições pueris que tenta enreda-las, continuam a mostrar um lado cigano, meio fora-da-lei, se por acaso a lei se puser no caminho de seus interesses particulares. Vejamos agora o homem. Os picos da civilização são exaltados com tanto foguetório pelos sentimentalistas, que não conseguimos enxergar seus desprogressos. Intrinsecamente, não passam de um ardil para pôr os homens na linha. Seu símbolo perfeito é a marcha tipo passo-de-ganso. No sentido convencional, o homem civilizado é aquele que melhor conseguiu frear e conter seus instintos sinceros e naturais – ou seja, o homem que cometeu as violências mais cruéis contra o seu próprio ego no interesse do bem-estar público. O valor deste bem-estar é sempre superestimado. Para que serve, no fundo? Simplesmente para favorecer o maior número – de velhacos, ignorantes e galinhas mortas. A aptidão para se submeter e prosperar confortavelmente nesta civilização de pés-rapados é muito mais marcante nos homens que nas mulheres, e maior ainda entre os homens inferiores do que entre os homens de categoria superior. Deve ser óbvio, até para um asno tão patético quanto um professor universitário de História, que pouquíssimos dos homens de primeira classe eram inteiramente civilizados, no sentido que lhe atribuem os jornais. Pense em César, Napoleão, Lutero, Frederico o Grande, Comwell, Barba Ruiva, Inocêncio III, Bolívar, Aníbal, Alexandre e, para chegar aos nossos tempos, Grant, Stonewall Jackson, Bismarck, Wagner e Cecil Rhodes. O fato de que as mulheres têm uma capacidade maior do que os homens para controlar e esconder suas emoções não é uma indicação de que elas sejam mais civilizadas, mas uma prova de que elas são menos civilizadas. Esta capacidade é uma característica dos selvagens, não dos homens civilizados, e sua perda é um dos prejuízos que a espécie tem pago por seus canhestros picos de civilização. O verdadeiro selvagem – sempre reservado, digno e cortês – sabe como mascarar seus sentimentos, mesmo diante da mais temível ameaça; o homem civilizado sempre se rende à ameaça. A civilização torna-se cada vez mais histérica e babona e, especialmente sob a democracia, tende a degenerar num mero bate-boca entre dementes. O único objetivo da prática política, por exemplo, é o de manter o povo alarmado (e, portanto, clamando por ser conduzido em segurança) por uma galeria interminável de capetas e papões, todos, claro, imaginários. As guerras fugiram ao controle dos homens superiores – os únicos capazes de julgar sem paixão, mas com inteligência, as causas por trás delas e as conseqüências que advirão. Agora passaram a ser declaradas assim que se põe uma multidão em pânico, e só terminam quando já esgotaram sua fúria. Neste ponto, o efeito da civilização foi o de reduzir uma arte que era o repositório da coragem, e da vocação inata de alguns dos melhores homens, ao nível de um assalto a um bordel ou ao de uma briga no cais. Todas as guerras da Cristandade são agora repelentes e degradantes; sua condução passou das mãos dos nobres cavaleiros para as dos demagogos, agiotas e camelôs de atrocidades. Para podermos reconstituir a guerra em grande estilo, como concebiam o príncipe Eugène, Marlborough e o velho Dessauer, temo que recuar aos povos bárbaros. 

 1921 O LIVRO DOS INSULTOS