domingo, 23 de outubro de 2016

Noite. Uma rua solitária na periferia. Um gato malhado salta entre os telhados enquanto cães ladram ao vento. O excesso de lixo saltou para fora das latas e escorreu pelo chão de terra. Baratas passeiam fugindo dos pés dos meninos que brincam de bola na via. Mães e irmãs mais velhas chamam para dentro os garotos de pés encardidos. É hora do banho e do jantar. Crianças recolhidas, já é tarde, agora chegam automóveis com ocupantes que procuram nas esquinas pelos empresários do pó. A lua e as estrelas observam o movimento. Dinheiro para cá, pó para lá. Negócio feito lá e vão os loucos em busca de alucinações, enquanto os empresários da farinha perigosa contam as notas. O inferno para ambos os lados é logo ali.

SOU DO TEMPO

Sou do tempo das galochas,
das calças de brim Coringa,
da Conga azul com bico de borracha,
das camisas de Volta ao Mundo,
do veludo e cotelê.
Sou do tempo que chamávamos meias de carpim,
dos campinhos de terra,
da bola de borracha,
do chiclete ping-pong,
dos padres de batina.
Sou do tempo se chamava motorista de chofer,
em que os rapazes tinham vergonha de pedir preservativo na farmácia,
e de quem engravidava moça de família se casava por livre obrigação.
Fui menino na época da novela Antônio Maria,
do avião turboélice da Sadia,
da avenida coberta de macadame.
Sou sim daquele tempo,
e confesso que fui um dos muitos meninos
que tinha medo de tomar vacina de pistola,
e que quase fugia da escola no dia de vacinação.


SOMBRAS TEDIOSAS

O objeto de não morrer em vida
É acalentar sonhos
Pois quem nada projeta para o amanhã
Já morreu e não sabe
Acorda todos os dias
Para entrar no círculo infinito
Da mediocridade galopante
Passa pelos dias sem vivê-los
Na opaca contemplação dos indivíduos que se movem
Misturando na fonte da inveja a covardia suprema de não tentar.

BANANAS

Aconchegadas na fruteira
São elas irmãs verdes deitadas
Ouvindo as conversas da casa
Em absoluto silêncio
Enquanto esperam pelo amarelo doce do amadurecer.

PRIMO DISTANTE

Ernesto  homem de boa fé
Abiu o armário e nele encontrou um esqueleto
Sem roupas e com a óssea mão direita sobre a boca
E na óssea mão  esquerda um preservativo
Por ser um homem bom
Não fez nenhuma objeção
Quando a mulher contou-lhe a história
De um primo dela distante
Que entrou no armário para pregar-lhe um susto quando chegasse
E que acabou esquecido.

BAGAÇA

Vivemos na era da mediocridade
Da política rasteira
Quase ninguém escapa
Desta pasmaceira
Quando o vivente votado não é asno
É inteligente
Porém bagaceira.

O IRMÃO DO SIM

Pais que dos filhos escravos
No sentido de fazer vontades
Esquecem-se de que um dia partirão
E deixarão os rebentos no mundo
Para enfrentar a dura vida realidade
Amor carinho e ternura
Favorece o relacionamento
Porém devem  observar
Que o sim
Tem um irmão que se chama não.

CRESCENDO

Ocupar o tempo enquanto é tempo
De mente sã e de pés inquietos
Trazendo para dentro do baú material de boa qualidade
E tendo no final de cada dia
A sensação de ter ficado um pouco menos ignorante.

“A CNBB fez a sua opção. A opção pelos podres.” (Mim)

“Durmo como um porco no rolete, girando de um lado para outro.” (Mim)

“O melhor amigo do homem solteiro é o cão. Quando ele se casa o cão corre para o lado da mulher, pois é cão, não é burro.” (Mim)

“Apenas repetir velhos clichês é a forma moderna do não pensar.” (Mim)

“Infância terrível, o peso do pecado caindo sobre o desejo sexual. Pegava no pinto e via o capeta tatuado nele.” (Mim)

“Se o paraíso é contemplação, duro será espantar o tédio.” (Mim)

Acostuma-te à lama que te espera. Coluna Carlos Brickmann



Eduardo Cunha, planejador meticuloso, sabia que ser preso era seu destino. Deve estar pronto para suportar o período atrás das grades. Mas, para ele, esta prisão era aceitável, fazia parte do jogo. O que o magoou muito foi a atitude de seus aliados, que o entregaram a Sérgio Moro.

Fique claro que, sem o trator Cunha no comando da Câmara, o impeachment seria só uma proposta, Dilma estaria no Poder, e Temer não. Temer deve seu posto a Cunha; a oposição e os governistas que mudaram de lado devem seu poder e seus cargos atuais a Eduardo Cunha. Mas não hesitaram em condená-lo no conselho de Ética (faltou apenas um deputado que virasse o voto!) e em cassar seu mandato, entregando-o à mão severa de Moro. Cunha queria só adiar um pouco a votação, para que as festas natalinas jogassem o problema para fevereiro ou março, dando-lhe uma chance de manobra. Com ajuda de Temer, adiar-se-ia a decisão para 2017. Isso é o que lhe dói: a ingratidão de quem se beneficiou com seu trabalho.

Cunha é um planejador detalhista, estudioso; como o diabo, sabe mais pela experiência que por seus outros atributos. Mas não imaginava que quem se beneficiou com seu trabalho quisesse tudo, menos tê-lo a seu lado. É sabido demais para não ser perigoso. Liquidado, é mais seguro. E não conhecia a frase definitiva do sábio general De Gaulle: "A ingratidão é uma das maiores virtudes de que deve ser dotado um estadista".

A mão que afaga


Os dois títulos destas duas notas estão num poema notável, Versos Íntimos, de Augusto dos Anjos, obrigatório para quem pensa em política:


Vês! Ninguém assistiu ao formidável/ enterro de tua última quimera.




Somente a Ingratidão - esta pantera - / Foi tua companheira inseparável! Acostuma-te à lama que te espera!




O Homem, que, nesta terra miserável/ Mora, entre feras, sente inevitável/ Necessidade de também ser fera.




Toma um fósforo. Acende teu cigarro!/ O beijo, amigo, é a véspera do escarro,/ A mão que afaga é a mesma que apedreja.




Se a alguém causa inda pena a tua chaga,/Apedreja essa mão vil que te afaga,/ Escarra nessa boca que te beija!



Folha corrida


É um perigo esquecer os bons resultados da ingratidão. Mas é um perigo, também, esquecer a força de retaliação de um aliado ferido.

Cunha se candidatou à Presidência da Câmara pelo PMDB, partido aliado a Dilma. Ela tentou derrubá-lo, ele reagiu: fez passar algumas medidas de alto custo, às quais Dilma se opunha. Quiseram cassá-lo, e ele deixou claro que, se o PT votasse por sua cassação, ele movimentaria o pedido de impeachment que estava parado em sua mesa. O PT votou contra ele, ele liberou o impeachment.

Dilma e Cunha caíram juntos.

A mão que apedreja


Segundo o jornal Valor, Cunha disse a seus advogados que quer falar. Um dos advogados, Marlus Arns, já intermediou processos de delação premiada. OK, ele pode deixar mal vários deputados do baixo clero, mas isso não lhe daria o que quer: que os promotores esqueçam sua mulher e sua filha.

Já o colar de alho, a estaca de madeira, a água benta e a terra consagrada que liquidariam Michel Temer, já isso vale muito mais.

Passarinho que come pedra

O noticiário de hoje em dia fala do medo que muitos parlamentares têm de eventual delação de Cunha. Que é que esse povo andou fazendo para ter tanto medo de um deputado que foi deposto, cassado e está preso?

O anel de brilhantes

Lembra de Fernando Cavendish, da empreiteira Delta, primeiro-amigo do governador fluminense Sérgio Cabral? Agora é ele que delata. Dizem que atinge PMDB e PSDB, cita-se o senador Aloysio Nunes e o governador goiano Marconi Perillo. Mas a melhor história é de Sérgio Cabral. Conta Cavendish que Cabral e ele passeavam por Monte Carlo quando Cabral parou em frente a uma joalheria finíssima, Van Cleef &Arpels.

"Amanhã", disse Cabral, "é aniversário de Adriana [sua esposa, Adriana Ancelmo] e preciso ver um presente". Entraram e uma funcionária trouxe, já embalado, um anel de ouro branco e brilhantes. E ficou claro que quem pagaria a conta, uns R$ 800 mil, seria Cavendish. Ilustrando a história, foto de Adriana Ancelmo com o anel, recibo e nota em nome da Delta.

Arrasador.

Boa notícia


A artista plástica brasileira Renata Barros acaba de expor no Museu de Arte de Hangzhou, na China. É um prolongamento cultural e artístico da reunião do G20. A "2016 - China Hangzhou G20 International Art Exchange Exhibition" reúne 40 artistas desde o dia 11 até hoje. Foi a primeira vez que o encontro diplomático teve extensão artística.


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carlos@brickmann.com.br

SÓ GENTE DA MELHOR ESTIRPE- Eletrobras vai trocar 50 executivos por eles terem destruido provas

A medida atinge um diretor da estatal e o presidente de uma das suas subsidiárias no Norte do país.

DO BAÚ DO JANER CRISTALDO-MES FORTS BRAS

Jamais pretendi defender tese de doutorado, aliás sequer sabia em que consistia este gênero literário em geral masturbatório com pretensões de ciência exata. No fundo, queria viajar, conhecer outras gentes. Os suecos têm um nome para isto: resfeber, febre de viagens. Contraí o vírus em Estocolmo. Consta que a doença não tem cura. Tinha quatro anos para redigir trezentas ou quatrocentas páginas, o que não exige nenhum esforço maior de um jornalista treinado na crônica diária. O mesmo vale para um professor de Letras que, teoricamente, deveria saber escrever.

Em um curso de metodologia, tive como professor um certo M. Decaudin, cujo nome me causava calafrios: temia, em um ato falho, tratá-lo por M. Decadent. O ato, aliás, não mais seria falho, já havia passado a habitar meu consciente. Em suas aulas, enfrentei meu primeiro inimigo teórico, o tal de método. M. Decadent (pardon!) exigia de mim um método, instrumento do qual jamais ouvira falar.

Fui consultar um professor gaúcho, Dionísio Toledo. Professor na Sorbonne, conheceria suas manhas. Toledo me recebeu amistosamente e me sugeriu diversas linhas de análise. Eu poderia usar um enfoque psicanalítico, a partir de Lacan ou Kristeva, se não me engano, ou quem sabe analisar os autores sociologicamente, a partir das obras de Goldman e sei lá mais quem, ou então, se não quisesse pensar muito, adotar um método estruturalista. Era uma noite de inverno, Paris estava coberta de neve. Caminhei vários quarteirões sem encontrar uma lata de lixo onde jogar a bibliografia que, por uma questão de cortesia, anotei em alguns papéis. 

Ça va, jeune-homme de la pampa?

A voz rouca o fez voltar 15 anos atrás. Jeune-homme de la pampa? Não acreditava no que ouvia. Só podia ser ela, Martine et sa belle poitrine. E só podia ser com ele. Fora ali mesmo, na terrasse do Select, que se haviam despedido, após acompanhar o enterro de Sartre. Ela, a militante do PC, dera estilo a seus ensaios e alegria a seus dias de Paris. Fora sua professora de francês na Sorbonne, depois chez elle, e depois... seu dicionário de travesseiro, a salvação de sua tese. Não foi fácil explicar-lhe que não era exatamente brasileiro, mas gaúcho. Falou da pampa, de seus habitantes e hábitos peculiares, cevou-lhe um chimarrão. Profilática, ela insistia em uma cuia e bomba individuais. Só aceitou chupar na mesma bomba ao saber que aquela era a bebida predileta de Che Guevara e assim devia ser tomada, coletivamente. Lembrou de um dito gaucho: mulher que toma mate em muitas bombas, nunca mais se acostuma com uma só.

Mas aquelas tardes esdrúxulas de chimarrão e camembert estavam mortas e bem mortas, como morto estava o jovem cheio de ilusões que um dia chegara a Paris para conquistar o mundo. Morta estava sua tese, seu entusiasmo pela literatura, suas esperanças no magistério. Visitava agora Paris como quem faz turismo pelo próprio passado e uma voz rouca ressuscitava dias que julgava também mortos. Abraçou-a com efusão.

Sentaram-se na terrasse, como se tivessem se despedido em Montparnasse na noite anterior. Como dizíamos ontem... Ambos com alguns quilos a mais, sua barba já poivre-et-sel, alguns fios brancos invadindo a crina loura da ex-professora. Ele, que abominava o stalinismo de Sartre, fora cair nos braços da militante. Quem te viu, quem te vê. Desejo não tinha ideologia. Resumiram, em traços rápidos, os quinze anos passados. Ele migrara de cidade, profissão e mulher. Brasil era eterno devir. França, águas paradas. Ela mudara apenas de endereço.

Passado volta? Tinha medo de um fiasco. Evocou seus seios, seus pelos, que um dia vira emergir do Mediterrâneo, gotejantes, numa praia em Cannes. Ela despediu-se com um olhar quente, passou-lhe o endereço. Esperava-o no sábado pela manhã. J ai besoin de tes forts bras.

Dormiu o sono dos anjos. Passado voltava, sim senhor! Pragmática, a francesinha. Queria-o em plena forma, de manhã cedo. Braços fortes? Pois não teme quem te adora a própria morte. O hino pátrio adquiria novo sentido às margens do Sena. Na sexta, moderou no vinho. Sentia-se um Jacques Brel revisitando uma antiga paixão. Ela ainda vira força em seus braços? Gentil Martine. Já se via auscultando sua generosa poitrine!

Chegou atrasado, os homens da transportadora já esperavam na porta do prédio. Operário francês, tu sais, reclamava Martine, eles não movem um dedo numa mudança, a gente tem de carregar tudo.

Um fio de pentelho puxa mais que vinte juntas de boi, tinha de convir. O Muro havia caído, a URSS se esfacelado e lá estava ele, carregando das profundezas de uma cave os arquivos da célula do PC de Montparnasse. Dependesse a marcha da História dos seios de Martine, nem tudo estava perdido.
quarta-feira, janeiro 31, 2007

NADANDO COM TUBARÕES

“Tive um primo que adorava nadar com tubarões. Foi bem, nadou por muitos anos. Tudo correu bem até o dia que os tubarões não tomaram o café da manhã em casa.” (Climério)

Até quando ainda veremos Renan e Lula dando discursos? Eles precisam é do bom ar que se respira no Paraná.

Excesso de peso

“Certa feita comprei uma balança para casa, mas não observei que era para peso até cem quilos. Subi nela com meus cento e trinta e deu no que deu; até no teto saltaram molas e parafusos.’ (Fofucho)

“Quando subo numa balança parece que estou diante de um pelotão de fuzilamento. Só falta a venda nos olhos.” (Fofucho)

PLACA DO DIA

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 DEVE SER AVISO ESPECIAL PARA O HOMEM-ARANHA.

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PRECOCIDADE

Precocidade é isso. O menino de dez anos chegou da escola, jogou a mochila no sofá e disse aos pais: Tenho um segredo para contar! Os pais olhando um para o outro: Conte-nos! Então disse: sou casado, e faz um bom tempo. Os pais não deram importância e tudo ficou por isso. No dia seguinte ele chegou da escola trazendo a mulher e dois filhos.