sábado, 17 de março de 2018

BLECAUTE


Vivíamos a Era do Sangue. A capital da República Federativa de Ignorabis, Ailisarb, ficou às escuras por muitas horas aquela noite de verão. Um inexplicável blecaute tomou conta de toda área urbana provocando um medonho caos. Acidentes de trânsito, assaltos, quebra-quebra nas lojas, estupros e outras violências. Corruptos e corruptores até saíram dos seus esconderijos. Alarmes da polícia e gritos da população se misturavam. A polícia não conseguiu atender nem metade dos casos, para desespero dos cidadãos. Também milhares de presos-vampiros foram liberados por seus parceiros dos seus caixões-celas e saíram às ruas em busca de alimento. Muitas pessoas indefesas foram atacadas pelos humanos-morcegóides em suas próprias casas fechadas. Nem mesmo mendigos escaparam de ter caninos cravados nos seus pescoços. A desgraça só não foi maior porque todos os Bares de Sangue permaneceram abertos por toda noite. Existiram baixas nos dois lados. O que se sabe é que muitos vampiros morreram de indigestão por excesso de sangue de corruptos e corruptores. Tipos assim não possuem sangue bom. Com o nascimento do sol a vida voltou ao normal.

O SUPERSTICIOSO


Virgulino era o cão de supersticioso. Sempre levantava da cama com o pé direito e não saía de casa sem antes consultar o horóscopo. Naquela manhã caminhava pela rua do comércio quando se deparou com uma escada erguida e um gato preto debaixo dela. Não pensou duas vezes: saiu da calçada e contornou pela pista. Mas levou azar o Virgulino: foi atropelado por uma carroça puxada por um burro. No hospital, com pernas e braços quebrados, ficou pensando se não era ele quem deveria estar puxando a carroça.

O CADÁVER E O URUBU


Década de 1940. Um urubu percebeu um corpo inerte estendido numa clareira na África. Fez o reconhecimento e pousou o sobre o cadáver. Nenhum leão em volta, tranquilo. Deu a primeira bicada, engoliu, sentiu náuseas, vomitou e foi então que percebeu que o corpo que devorava pertencia a um capitão SS carregado de medalhas. Fez cara de nojo, escreveu um bilhete e jogou sobre o corpo: ”Urubus, comida apenas para vermes, tenham cuidado!”

ROSE E A PERERECA MÁGICA


Era uma vez uma moça chamada Rose que sonhava com o luxo e viajar pelo mundo. Mas Rose não tinha condições, era pobre, seu salário não alcançava voos maiores. Um dia Rose teve a visita de uma fada madrinha. A boa fada lhe presenteou com uma perereca mágica. De posse de tal poder, Rose abriu portas rentáveis e viajou pelo mundo. Até namorou um sapo barbudo, depois príncipe. E com esse príncipe conheceu reinos distantes mundo afora. O azar de Rose foi que o príncipe viajava por conta do tesouro, os escribas descobriram e a perereca mágica perdeu seu encanto e foi banida do reino.

ALMOÇO EM FAMÍLIA


A família do nobre doutor Epaminondas estava reunida para o tradicional almoço dominical. Um pouco antes de ser servido o almoço, Eduardinho, filho único do doutor Epaminondas com Dona Letícia pediu para falar:
“Serei breve, meus queridos familiares. Agora que completei dezoito anos assumo as rédeas da minha vida e do meu destino. Gostaria de comunicar a todos que sou gay. Peço que me entendam.”
O Doutor Epaminondas que já estava em pé foi em direção ao rapaz e o abraçou dizendo:
“Meu filho, que alívio! Pensei que você fosse comunista!”

NAVEGO


Nem todo dia as águas estão calmas
Tempestades açoitam a rotina
Então às vezes paro e sonho para me fortalecer
Pois a vida se torna muito pobre quando não há mais sonhos e esperança.

DESPACHADO


Um dia tudo passa
A dor
O amor
O choro
O riso
A tristeza
A alegria
No final de tudo
Só resta um corpo inerte
Deitado sobre e cercado de madeira
Pranteado por seus amados
E como praxe da vida que segue
Encaminhado para o esquecimento.


MORTES?


Mortes?
A vida tem muitas mortes
Feitas por nossas escolhas
Espero escolher certo
E morrer uma vez só.


INGÊNUO LEAL



Ingênuo Leal
Era como o nome tal
E quando tentava dormir
Não se ajeitava na cama
Incomodado com a cabeceira
Foi quando descobriu que dobrando os chifres
Poderia dormir como um urso hibernado
Assim fez e foi um corninho feliz para sempre.