segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Caio Blinder- Democratas são uma espécie quase extinta no sul dos EUA

A humilhação eleitoral dos democratas nas eleições americanas de 4 de novembro se arrastou até o último sábado com o fracasso, no segundo turno da votação, da senadora Mary Landrieu para ser reeleita. A partir de janeiro, os republicanos terão uma maioria folgada no Congresso (já tinham na Câmara e em novembro conquistaram o Senado, onde terão 54 das 100 cadeiras). A impopularidade do presidente Barack Obama contribuiu bastante para a humilhação democrata.
A derrota de Mary Landrieu, herdeira de um clã político no estado sulista da Lousiana é histórica. Com a perda de sua cadeira, os democratas são uma espécie quase em extinção na região conhecida como Deep South. São os sete estados originais da Confederação que racharam com a União na Guerra Civil (1861-65), quando ocorreu o fim da escravidão.
Nos sete estados do Deep South, os democratas estão privados de governos estaduais e controlam apenas uma cadeira de senador, Ben Nelson, na Flórida, que tem um perfil demográfico muito peculiar (com latinos e aposentados que vieram de partes mais liberais do país).
E sem o estado da Virgínia, cuja demografia mudou nos últimos anos, o cenário é simplesmente desolador para os democratas nos outros estados que compunham a Confederação e onde o esquema de segregação vigorou de forma escancarada e legal até os anos 60. A partir de janeiro, apenas 39 das 145 cadeiras sulistas no Congresso serão democratas.
Foi justamente a aprovação da lei dos direitos civis em 1964, impulsionada por um presidente sulista e democrata, Lyndon Johnson, que alterou o quadro partidário, desembocando na hegemonia conservadora no Deep South do país, onde ainda estão alguns dos estados mais pobres e preconceituosos, como Alabama e Mississippi (ambos possuem uma alta percentagem da minoria negra).
Até os anos 60, o Partido Democrata era uma coalizão formada por sulistas segregacionistas e por liberais de outras partes dos EUA (não podemos esquecer que o venerável libertador dos escravos foi o republicano Abraham Lincoln.
George Wallace, forever
George Wallace, forever
Nos anos 60, Johnson estava plenamente consciente do preço que seu partido pagaria com o fim da segregação: a perda do sul para os democratas. Na época do racismo legal, o Deep South era um feudo democrata. O partido controlava qusse 100% dos legislativos estaduais, governos estaduais e cadeiras no Congresso.
Existem imagens icônicas de governadores democratas que resistiriam até o fim contra o fim do racismo legal. Na frase de George Wallace na sua posse como governador do Alabama em 1963: “Segregation now, segregation tomorrow and segregation forever.”
Ademais, houve uma virada mais acentuada dos democratas para as posições liberais (o que se rotula de progressismo fora dos EUA), em particular nas chamadas guerras culturais (questões como religião, aborto, direitos de minorias, casamento gay e controle de armas), enquanto a virada conservadora dos republicanos foi ainda mais emblemática.
A guerra pelo sul americano ainda não está completamente perdida para os democratas. Um teste vital será a eleição presidencial de 2016, quando deverão comparecer às urnas de forma mais expressiva um eleitor mais diversificado e urbano, mesmo no sul, entre os quais  jovens e brancos com maior qualificação profissional e educacional, que integram a base de sustentação democrata. Outro ponto: nove dos 10 estados com maior crescimento da população latina (mais afinada com os democratas) estão no sul.
No entanto, será preciso mais do que uma guinada demográfica para resgatar um modelo de democrata sulista mais centrista (como a derrotada Mary Landrieu). O partido vai precisar investir menos tempo nas guerras culturais que polarizam e mais nas preocupações materiais de uma classe média e de setores brancos mais pobres que estão aflitos , apesar dos sinais positivos na economia.
E há a esperança de que a partida de Barack Obama da Casa Branca leve céticos eleitores brancos no sul dos EUA a darem uma outra chance aos democratas. Esta é a aposta de Hillary Clinton.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.