PERDIDA NA NOITE
Num canto escuro de uma esquina mal-cheirosa, agarrada nos tijolos de
um prédio sujo, ela vomitava. Suas pernas manchadas de bexigas roxas
demonstravam a falta de cuidado que tinha para consigo. Um homem bêbado passou
perto e disse alguns gracejos enquanto ela jogava fora sua saúde encharcada de
álcool pelas noites da vida. Após o pior passar ela levantou os olhos para o
céu e viu a lua olhando para sua carcaça desalinhada. Por um breve momento
pensou nos sonhos de menina que o tempo tratou de pulverizar. Tinha perdido o
juízo; a juventude tão gostosa de ser vivida; os amigos verdadeiros; a família
que ela mesma deixara para trás. Caminhou alguns quarteirões até seu quartinho
acanhado no hotelzinho de quinta categoria. Abriu a porta e sentiu no nas
narinas o cheiro de mofo que dominava o cubículo. Sentou-se na cama e acendeu
mais um cigarro, talvez o trigésimo da noite.Tudo à sua volta rodava, os olhos
de peixe morto, pálpebras caídas.Após fumar, apagou o venenoso e se deitou
sobre o cobertor que já cobrava por limpeza. Apagou. Mais uma noite de trabalho
encerrada, mais um dia vivido sem alegria no coração.
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