sábado, 11 de abril de 2015

Caio Blinder- Rabiscos humanitários (Arábia Saudita)

Uma família vítima da barbárie institucional saudita

A barbárie jihadista praticada por grupos como Estado Islâmico, Shabab e Boko Haram ganha manchetes. É a barbárie do islamismo político em ação. Nunca, porém, podemos esquecer da barbárie institucional do islamismo político praticada por países como Arábia Saudita e Irã. O confronto entre sunitas e xiitas exige análises cerebrais e rabiscos estratégicos como as que eu tenho me aventurado a fazer. Não quero, porém, relegar a dimensão meramente humana no cenário desolador e não falo apenas da tragédia em larga escala em zonas de guerra como no Siraque ou agora no Iêmen. Eu falo da tragédia individual.
Já escrevi sobre o saudita Raif Badawi. Quero martelar no assunto, dar mais uma chibatada. Asilada no Canadá, Ensaf Haidar acaba de publicar um texto sem floreios sobre o seu marido, preso desde 17 de junho de 2012. Ela o define como “pai dos meus três filhos, meu melhor amigo, homem de princípio e um respeitado ativista”.
Em 2008, Raif lançou um blog para discutir abertamente religião, política e questões sociais. No entanto, o preço na Arábia Saudita para exercer uma atividade tão prosaica é exorbitante, é doloroso. Raif foi condenado por insultar o Islão. Em um espetáculo de crueldade, em janeiro passado, ele foi submetido a 50 chibatadas. Ainda tem uma dívida de mais 950, além de mais sete anos de prisão.
A barbárie quem sabe não acabe por aí. Recentemente, Ensaf Haidar soube que existem esforços para levar Raif novamente a julgamento sob acusação de apostasia, por ter renunciado ou abandonado o islão. Pela lei saudita, tal acusação é punível com morte, normalmente decapitação. Pelas informações recebidas pela família, a Corte Suprema da Arábia Saudita remeteu o caso de Raif para o mesmo juiz que o sentenciou a dez anos de prisão e às 1000 chibatadas. E este juiz já solicitou duas vezes que Raif seja acusado de apostasia.
Com o clamor internacional, de muitos governos e da opinião pública, Raif não foi flagelado por 11 semanas consecutivas. Mas nunca se sabe quando o ritual bárbaro será novamente colocado em prática. As chibatadas da pressão global não podem cesssar. Publicamente, a Casa Branca não se manifesta (ao contrário de 60 congressistas americanos que mandaram carta para o rei saudita).
Ensaf Haidar escreve que, antes de sua prisão, Raif escreveu: “Nós queremos a vida para aqueles que desejam a nossa morte. E queremos racionalidade para aqueles que querem ignorância para nós”.
Devemos desejar que Raif viva, que não seja mais flagelado por ser uma luz contra as trevas e que sua mulher e três filhos possam voltar a uma Arábia Saudita diferente.
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