sábado, 20 de dezembro de 2014

Portal Libertarianismo- Interstellar – liberdade e as fraquezas do progressismo

Alerta de spoiler! Esse texto contêm dicas sobre a trama do filme Insterstellar.
Uma das bases do pensamento político progressista é que especialistas deveriam ser colocados no comando das políticas públicas, utilizando uma “gestão científica” e uma análise política “baseada nas evidências” para determinar e por em prática políticas sociais. Poucas áreas têm sido tão invadidas por essa perspectiva que a política científica. Mas essa ideia pode ter sofrido um duro golpe da cultura pop no novo filme Interstellar de Christopher Nolan, embora possa ser, inicialmente, difícil perceber.
À primeira vista, Interstellar parece um clichê – a Terra está à beira de um apocalipse ambiental, e cabe a um pequeno grupo de bravos cientistas e um piloto de testes da NASA encontrar um novo mundo para os humanos colonizarem. A épica odisseia espacial inclui toneladas de efeitos especiais, um roteiro firme, e uma excelente atuação de Matthew McConaughey (Joseph Cooper, ex-piloto da NASA), Anne Hathaway (como Amelia Brand, cientista da NASA), Jessica Chastain, Michael Caine (Dr. John Brand), John Lithgow, and Matt Damon (Dr. Mann), entre outros.
Mas a história do filme Interstellar pode ser mais importante pelo que deixa de fora em vez do que efetivamente contempla. Em vez de adotar a abordagem politicamente correta de colocar os humanos no centro da catástrofe climática (embora a superpopulação seja considerada um fator importante, até mesmo por questão de plausibilidade popular), o filme explora esperança, perseverança e criatividade humana. É na área da criatividade humana que o filme de Nolan estabelece uma clara, porém sútil crítica aos especialistas como árbitros do futuro da humanidade e um argumento implícito em prol da liberdade como essencial à inovação.
Em uma história assentada por camadas (mas não sinuosa), o núcleo do filme inclui temas focados na comunicação, conexão humana, e fé na habilidade humana de inovar, confiar e perseverar. Uma equipe desorganizada de especialistas, sob o comando do Dr. Brand (Caine) é tudo o que sobrou da NASA, enquanto tempestades de areia consomem o que restou das áreas habitáveis da Terra. Eles têm a tarefa de assegurar a sobrevivência da humanidade por meio de um esforço científico de longo prazo de viagem através de um buraco negro até uma nova galáxia a procura de um novo planeta e casa. Os cientistas acreditam que uma inteligência alienígena criou um buraco negro com o intuito de salvar a raça humana. Então, a NASA envia sondas espaciais tripuladas para encontrar um novo planeta. A maioria falha, mas encontram três boas alternativas, estabelecendo a necessidade de envio de uma tripulação mais completa, incluindo o experimente piloto de testes Cooper e outros cientistas capazes de estabelecer uma nova colônia. A parte científica é plausivelmente exata, e envolve a exploração da chamada “quinta dimensão” da física, a dimensão além do tempo que tenta ligar a gravidade e as forças eletromagnéticas (a teoria Kalluza-Klein).
Mas existe um detalhe que poucos parecem ter percebido: o filme critica severamente o comando de especialistas em favor da criatividade individual. O enredo do filme está intrinsecamente ligado à missão especial de determinar se os habitantes da Terra podem ser evacuados para um novo planeta antes que seja tarde demais (plano A), ou se iniciar uma nova colônia utilizando milhares de óvulos fertilizados congelados (plano B). Joseph Cooper (McConaughy) é motivado a participar da missão por querer salvar a humanidade e a sua família, então ele está apostando no plano A. Ambas as opções são propostas pelo cientista principal e líder do projeto, John Brand. Ele é um especialista que – chamado muitas vezes de “Professor” ou “Doutor” – aproveita-se de seu conhecimento científico, de sua experiência na NASA, e de sua compreensão do destino da humanidade, para criar esses planos como as duas únicas opções viáveis.
Nós sabemos, todavia, que o plano B sempre foi a única solução, mesmo que tenha sido apresentada a Cooper como uma opção igualmente viável. Não se esperava, sinceramente, que Cooper, sua família, e o resto da espécie humana ainda na Terra sobrevivessem. Na verdade, Brand (Michael Caine) manipula toda a tripulação, incluindo sua filha Amélia (Anne Hathaway), para assegurar que eles aceitem a missão e implementem o plano B, o qual é povoar outro planeta com humanos. (No que parece um giro coincidente, mas intrigante, o outro antagonista principal acaba sendo o Dr. Mann. Na vida real, não no filme, Michael Mann é um climatologista da Universidade Estadual da Pensilvânia há muito acusado pelos céticos de propositalmente apresentar estatísticas de forma a exagerar os efeitos da mudança climática para manipular as políticas públicas).
Sem dizer muito mais, como qualquer boa história, vamos dizer que nem o plano B nem o plano A acabam sendo a melhor solução. Através de muitas alucinantes interações físicas (que eu não entendo, mas estou disposto a aceitar em um filme de ficção científica), Cooper acaba salvando a humanidade por meio de sua astúcia e fé no poder criativo de sua família e de outros humanos que estão na Terra. Em resumo, os especialistas perdem, mas os cientistas ganham.
O roteiro revisado de Christopher Nolan (primeiro escrito para Steven Spielberg pelo seu irmão Jonathan Nolan) habilmente conduz esse jogo entre gestão científica e questionamento científico individual na última meia hora do filme como a audiência lentamente reconhece a futilidade de ambos os planos. Com o aumento do desespero de Cooper, a audiência nunca está realmente certa se a humanidade sobreviverá. É da derrota final da mente científica, por meio de sua morte natural, que a capacidade criativa dos outros seres humanos da Terra é finalmente liberada. Sua disposição a pensar de forma diferente, interpretar novas informações, e jogar com a inspiração umas das outras (particularmente Cooper e sua filha adolescente) levam a história até a resolução, tanto como um filme que pode capturar a imaginação da audiência popular, assim como um conto da sobrevivência da humanidade.
É claro, esse final é muito mais historicamente fundamentada que o fim apocalíptico prognosticado pela maioria dos pessimistas. Mais importante, enquanto as ciências salvam a humanidade, é a perseverança individual e a aplicação humana desse conhecimento dentro de um ambiente no qual o livre pensamento, experimentação, descoberta e discussão com os mestres científicos – liberdade pessoal – que oferece salvação, não redenção. Assim, além de ser um bom filme, Interstellar carrega uma mensagem pró-liberdade que vale a pena pensar em um nível mais profundo.
 // Traduzido por Matheus Pacini. Revisado por Russ da Silva | Artigo original.

Sobre o autor

sam
Samuel R. Staley é diretor administrativo do DeVoe L. Moore Center na Faculdade de Ciências Sociais na Universidade Estadual da Flórida.

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