sexta-feira, 8 de julho de 2016

“Sem lenço e sem documento”. Leia artigo de Roberto Luis Troster

Seria bom se fosse como na canção de Caetano, “nada nos bolsos ou nas mãos, eu quero seguir vivendo”. Mas não é. A cada ano, milhões de horas de cidadãos e funcionários públicos são gastas com a tarefa de manter a papelada pessoal em dia.
A caminhada contra o vento é numa estrada com várias cabinas de pedágio (repartições). Prevalece a lógica de um povo para servir o governo, em vez de um governo para o povo.
As raízes das dificuldades são históricas. O Brasil tem dimensões continentais e, ao longo do tempo, foram estabelecidos os controles considerados mais adequados para cada época e propósito. Adicionando-os aos já existentes, sempre aumentando a parafernália.
Não é um problema nacional, apenas. A burocracia no mundo inteiro é avessa a mudanças, inflexível, ineficiente, tem uma tendência a se autoperpetuar e a apresentar disfunções como falta de comunicação entre os diversos órgãos e obsolescência dos controles.
Aumentaria a produtividade da população e do governo se cada cidadão tivesse apenas um documento usado por todos os órgãos públicos
Estatísticas do Banco Mundial mostram que o Brasil é um dos países em que é mais complicado contratar empregados, produzir, vender e cobrar. Exigências burocráticas inadequadas aumentam custos e diminuem a competitividade das empresas sediadas aqui. A produtividade pessoal também é afetada.
Não há estudos sobre o impacto da papelada necessária para o dia a dia, mas é razoável afirmar que atrapalha e muito. A inclusão econômica básica de um cidadão demanda necessariamente a carteira de trabalho, o RG, o CIC, o PIS, o título de eleitor e, se for homem, o certificado de reservista. Algumas profissões demandam ainda o registro nos respectivos conselhos regionais.
Cada cidadão tem de cinco a sete números diferentes para ser identificado. Mesmo assim, a segurança desse sistema é frágil. Há poucas semanas, um jornalista da Folha conseguiu emitir nove RGs em diferentes unidades da Federação. Mostrou que o controle é fraco. Também é deficiente. Abundam relatos de pessoas pressas por engano e de prejuízos causados por homônimos.
Agravando o quadro, o processo é trabalhoso. Quando um cidadão muda seus dados cadastrais, como endereço ou estado civil, tem que informar a todos os órgãos (Receita, Justiça Eleitoral etc.). É uma peregrinação de repartição em repartição.
É um sistema antiquado, disperso em órgãos públicos diferentes, com registros de informação que não se comunicam entre si e que depende da datiloscopia (impressões digitais em papel) para identificação.
A recomendação é a construção de um cadastro nacional, usando biometria, que permita uma caracterização pessoal imediata.
Cada cidadão teria um único número para se identificar e este seria usado por todos os órgãos públicos para fins específicos (eleições, benefícios etc.). Isso geraria ganhos de produtividade para toda a população e para o governo.
O direito à identidade é, ou pelo menos deveria ser, um direito básico, um bem em si mesmo. Mas é custoso, demorado e inseguro. Há avanços tecnológicos que permitiriam corrigir as distorções rapidamente, com benefícios palpáveis para todos. Por que não, por que não…
Fonte: Folha de S.Paulo
Instituto Millenium

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