segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Portal Libertarianismo- O humilde argumento em prol da liberdade

[Este artigo corresponde ao 8º capítulo do livro "Liberdade - A ideia que está mudando o mundo", lançado em formato digital pelos Estudantes pela Liberdade.] 
Eu poderia estar errado sobre praticamente tudo. O que não sei supera tanto o que sei que meu conhecimento efetivo parece tão pequeno quanto um pequeno barco em um oceano de ignorância.
Eu não me envergonho de admitir esse fato desagradável, não somente porque não há vergonha em admitir a verdade, mas também porque todo mundo está no mesmo barco. Nossa ignorância – o que não sabemos – sempre e consideravelmente supera nosso conhecimento. É verdade até mesmo para os mais educados e espertos.
Reconhecer tal fato deveria nos tornar humildes. E essa humildade, tendo em vista a forma pela qual o governo opera, deveria nos tornar libertários. O libertarianismo é a filosofia da humildade, a qual nos aceita como somos e nos concede a liberdade de fazer o máximo dentro de nossas capacidades. E é a filosofia que compreende o quão prejudicial as falhas humanas podem ser quando associadas ao poder coercivo do governo. O libertarianismo limita os governantes porque reconhece que os governantes são apenas pessoas normais que exercem um poder extraordinário – e que o dano que aquele poder pode infringir com frequência supera o bem que pode prover. O libertarianismo é baseado na humildade e se recusa a tolerar a arrogância daqueles que se consideram superiores ou mais fortes do que os outros.
Vamos começar analisando o que significa ter uma visão humilde de nossas pretensões de conhecimento. Cada um de nós certamente parece saber muito, do que comemos pela manhã ao número de luas que orbitam Marte. Nós sabemos que George Washington foi o primeiro presidente dos Estados Unidos da América, Boris Yeltsin foi o primeiro presidente da Federação Russa, e que dirigir bêbado é uma má ideia.
Se analisarmos a história intelectual de modo geral, vemos uma convicção refutada após a outra. O que era uma verdade científica 300 anos atrás é, hoje, palavrório. Outrora, os mais brilhantes acreditavam que você poderia entender a mente e o caráter de um indivíduo através do estudo das protuberâncias de sua cabeça, teoria a qual recebeu um nome cientificamente pomposo: frenologia. Os sábios e os grandes pensadores estavam uma vez certos de que a Terra estava no centro do universo.
Não é somente a ciência que não parece acertar sempre e de forma definitiva. Pessoas muito inteligentes argumentam sobre complexos problemas filosóficos desde sempre. Dois mil e quinhentos anos atrás, Platão pensou que tinha descoberto o real significado de justiça. Desde então, muitos filósofos dele discordaram – mas nenhum ofereceu uma alternativa que, em si, não fosse suscetível a um bom contra-argumento.
Devemos sempre ser céticos quanto a alegações de conhecimento absoluto. Se você acredita que uma questão filosófica já foi resolvida, você está quase certamente errado. Se você acredita que a ciência, hoje, entende um tópico na sua totalidade, você provavelmente concluirá que não é assim dentro de alguns anos. Além disso, se somos devidamente céticos quanto ao conhecimento da humanidade em geral, devemos ser ainda mais céticos com relação a afirmações de certeza vindas de indivíduos de nossa espécie. Porém, tudo isso não nos impede de frequentemente sentir como se não pudéssemos estar errados.
Foi na faculdade que comecei a entender quão comum é a arrogância intelectual. Fiquei perplexo com a amplitude de conhecimento que meus professores julgavam ter. Nos filmes de comédia norte-americanos do início do século XX, um PhD sentia-se qualificado a criticar os estudos de vanguarda da Física e palestrar aos seus alunos sobre quais tipos de câncer deveriam receber maior financiamento. Isso também acontece fora da universidade, em especial, na política. Quantos norte-americanos analisam a fantástica complexidade de nosso sistema de saúde e dizem, “Oh, eu sei como resolver isso”? Quantos eleitores, mesmo sem um conhecimento básico de economia, pensam saber quais propostas efetivamente promoverão a prosperidade? É preciso algum esforço para admitir que estamos errados sobre coisas nas quais temos boas razões para acreditar. Mas, pelo menos, deve ser mais fácil reconhecer quando claramente não sabemos nada sobre um assunto.
Além disso, a maioria de nós não é devidamente cética quanto à transição entre o conhecimento de fatos e o conhecimento de valores. Considere os nutricionistas, por exemplo. Eles acreditam que sabem quais alimentos são mais saudáveis, isto é, que nos dão mais nutrientes com as menores chances de nos fazer mal. Se consumirmos a substância X, podemos esperar o resultado Y. (É claro, mesmo esse conhecimento mudou drasticamente nos últimos anos). Todavia, note que esse “é” não significa “deve”. O que é saudável é uma questão totalmente diferente do que eu devo comer.
Eu posso reconhecer que batatas fritas não são tão saudáveis como brócolis refogado, embora ainda esteja certo de que, hoje, eu deveria comer batatas fritas no jantar. Pois o que eu deveria comer não significa, necessariamente, a mesma coisa que ‘o que é mais saudável para mim’. “Deveria” pode incluir outros valores, tais como o prazer que obterei, os preços variados das alternativas e assim por diante. A nutrição diz respeito a um valor – o que é saudável – mas não tem nada a dizer sobre os outros.
O ceticismo apropriado se aplica tanto aos outros quanto a nós. Eu deveria ser cético sobre as afirmações de certeza absoluta, assim como ser cético quanto à veracidade das minhas próprias convicções.
Obviamente, tal ceticismo não deveria nos fazer abandonar todas as pretensões de conhecimento, mas sim nos levar a adotar uma atitude de humildade. Por saber que os outros enfrentam as mesmas dificuldades na apuração da verdade, também devemos esperar humildade de parte dos nossos oponentes intelectuais.
É nesse ponto que a humildade nos impele ao libertarianismo. Se abraçarmos o ceticismo legítimo sobre o conhecimento tanto da verdade como dos valores, deveríamos hesitar antes de convencer pessoas que discordam de nós a seguirem nossas convicções. Deveríamos hesitar, em outras palavras, antes de usarmos um cassetete ou chamar a polícia para que o faça.

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