sábado, 16 de maio de 2015

Caio Blinder-Para (tentar) entender o conflito entre sunitas e xiitas

Em texto no Wall Street Journal, o antenado repórter Yaroslav Trofimov nos alerta contra o dogma de ver o conflito entre sunitas e xiitas como meramente um cisma teológico e não também como um reflexo de uma luta moderna pelo poder. Claro que existem as raízes do conflito em torno da sucessão do profeta Maomé, mas por muitos séculos o racha não foi tão sangrento como nas últimas décadas e se tornou especialmente explosivo quando a religião se misturou com a política.
Xiitas acreditam que o poder deveria ter ido para Ali, o genro de Maomé, e para o neto Hussain; para os sunitas, não deveria ser hereditário. Nada como trazer afiadas armas sectárias para agravar um conflito no Oriente Médio e vizinhanças. Ironicamente, com o colapso do anacrônico Império Otomano após a Primeira Guerra Mundial, as rivalidades entre sunitas e  xiitas pareciam obsoletas e por décadas os rachas eram entre regimes conservadores pró-ocidentais e os revolucionários alinhados com a ex-URSS
A transformação moderna do conflito remonta à revolução xiita no Irã de 1979, quando os regimes sunitas da Arábia Saudita e do Paquistão responderam à pretensão de Teer ã por uma liderança global dos muçulmanos, desafiando as credenciais islâmicas dos aiatolás. Ocorrera também na mesma época a invasão soviética do Afeganistão. Como parte da resistência, o ditador paquistanês Zia ul-Haq islamizou o seu regime e um subproduto foi o incremento dos massacres da minoria xiita no país.
A rivalidade sectária ganhou novo vigor com a invasão americana do Iraque em 2003. O vizinho Irã saiu fortalecido com a queda do ditador sunita Saddam Hussein e os xiitas iraquianos ganharam poder. O jihadismo ensandecido do grupo sunita Estado Islâmico tem origem na convulsão iraquiana pós-invasão americana. O ódio religioso atingiu uma intensidade genocida com a guerra civil síria e o alinhamento sectário se cristalizou agora na guerra civil do Iêmen, onde os sauditas lideram uma coalizão de países sunitas contra rebeldes da seita houthi (xiita) apoiados pelo Irã.
Os xiitas representam pouco mais de 10% dos muçulmanos no mundo e o Irã é um país persa e xiita numa região predominamente árabe e sunita. Tentou liderar a região em nome da resistência islâmica contra os EUA e Israel. As ambições acirraram os conflitos com regimes sunitas e o efeito foi aproximar de Israel alguns dos mais conservadores, como a Arábia Saudita.
Hoje, os sauditas enfatizam a identidade xiita dos rivais iranianos e investem neste conflito iemenita contra os rebeldes da seita houthi. No entanto, os sauditas não pensaram duas vezes na década de 60 para apoiar rebeldes monarquistas xiitas no Iêmen, predecessores dos atuais insurgentes houthis, contra tropas invasoras dos egípcios sunitas que na época eram alinhados com os soviéticos. Agora, o regime militar egípcio está alinhado com os sauditas no conflito iemenita.
Deu para entender ou tudo continua desalinhado?


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.