quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Por que não sou Cristão: um exame da ideia divina e do cristianismo Bertrand Russell


O argumento quanto à reparação da injustiça

Há uma outra forma muito curiosa de argumento moral, que é a seguinte: dizem que a existência de Deus é necessária a fim de que haja justiça no mundo. Na parte do universo que conhecemos há grande injustiça e, não raro, os bons sofrem e os maus prosperam, e a gente mal sabe qual dessas coisas é mais molesta; mas, para que haja justiça no universo como um todo, temos de supor a existência de uma vida futura para reparar a vida aqui na Terra. Assim, dizem que deve haver um Deus, e que deve haver céu e inferno, a fim de que, no fim, possa haver justiça. É esse um argumento muito curioso. Se encarássemos o assunto de um ponto de vista científico, diríamos: “Afinal de contas, conheço apenas este mundo. Nada sei do resto do universo, mas, tanto quanto se pode raciocinar acerca das probabilidades, dir-se-ia que este mundo constitui uma bela amostra e, se há aqui injustiça, é bastante provável que também haja injustiça em outras partes”. Suponhamos que recebeis um engradado de laranjas e que, ao abri-lo, verificais que todas as laranjas de cima estão estragadas. Não diríeis, em tal caso: “As de baixo devem estar boas, para compensar as de cima”. Diríeis: “É provável que todas estejam estragadas”. E é precisamente isso que uma pessoa de espírito científico diria a respeito do universo. Diria: “Encontramos neste mundo muita injustiça e, quanto ao que isso se refere, há razão para se supor que o mundo não é governado pela justiça. Por conseguinte, tanto quanto posso perceber, isso fornece um argumento moral contra a deidade e não a seu favor”. Sei, certamente, que os argumentos intelectuais sobre os quais vos estou falando não são, na verdade, de molde a estimular as pessoas. O que realmente leva os indivíduos a acreditar em Deus não é nenhum argumento intelectual. A maioria das pessoas acredita em Deus porque lhes ensinaram, desde tenra infância, a fazê-lo, e essa é a principal razão.

Penso, ainda, que a seguinte e mais poderosa razão disso é o desejo de segurança, uma espécie de impressão de que há um irmão mais velho a olhar pela gente. Isso desempenha um papel muito profundo, influenciando o desejo das pessoas quanto a uma crença em Deus.

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