quarta-feira, 19 de abril de 2017

QUANDO O CRIME FAZ AS LEIS por Percival Puggina. Artigo publicado em 17.04.2017

É cruel a situação dos bolsões urbanos onde o crime se enquadrilha e rege a vida das pessoas de bem. Além está o mercado das vítimas, cuja juventude deve ser levada ao vício, cujos bens devem ser tomados e cuja vida não tem valor. Nenhum chefe do crime paga um vintém pelo corpo estendido no chão. Seu carro, este sim, tem custo e preço. É o "capitalismo" da criminalidade, que certa esquerda, por algum motivo, reverencia como justiceiro.
 Observo o Brasil que se vai revelando aos nossos olhos e percebo muita semelhança. Aqui atuava e dava ordens uma rede de organizações criminosas incrustadas em inúmeros centros de poder. A partir deles eram prestados alguns serviços à nação que os recepcionava na intimidade das instituições republicanas. Migalhas, distribuídas como farelo a pintos. Enquanto discursavam sobre o estado do bem estar social, viviam às custas dos miseráveis na mais escandalosa suntuosidade. A dependência é análoga à que os chefes do tráfico estabelecem sobre as regiões onde se abrigam.
 Nos novelos desenrolados pela Lava Jato foi-se sabendo que, em imensa proporção, decisões e atos do poder público tinham preço e constituíam mercadoria. Eram como drogas que intoxicavam a sociedade, a economia, a política, o direito e a justiça. Vendiam-se leis, portarias, medidas provisórias e emendas. Vendiam-se contratos, financiamentos, taxas especiais de juros, informações privilegiadas e audiências. "Alô, alô, freguesia! Quem quer uma isenção ou beneplácito para alguma falcatrua?". Mercantilizavam-se ministérios e se compravam partidos até acabar o estoque. O foro privilegiado era a sobrecapa do descaramento, regalia indisponível, aliás, ao colega lá do morro, com correntes de ouro no pescoço.
 E agora, que podemos dizer como Drummond a José que a festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu e a noite esfriou? Agora devemos ter plena consciência de que também na nossa comunidade bandidos fazem leis. E elas saltam dos recantos do Congresso Nacional como pipoca na panela que esquentou. Vão da incrível legalização do caixa-dois à inibição dos poderes do Ministério Público e do Judiciário, passando pela enxurrada de dinheiro público para o financiamento das futuras campanhas eleitorais. Mas seu lugar de honra está na Comissão Especial da Reforma Política. Ali se jogam lances como o voto em lista fechada pré-ordenada, uma proposição cujo simples enunciado espanca a democracia. Segundo ela, não serão mais os eleitores, com os votos dados aos candidatos de sua preferência, que atribuirão mandatos aos mais votados. Isso não convém àqueles cujos rostos e negócios se tornaram conhecidos. Como farão campanha, colarão cartaz em muro e se exibirão na TV? Sem voto, vai-se o mandato. E sem o mandato, o futuro passa, em 2019, pela pista do aeroporto de Curitiba.
 Com a lista fechada e pré-ordenada, defendida pelos investigados, a começar pelos presidentes das duas casas do Congresso, pelo presidente e pelo relator da Comissão da Reforma Política, a situação fica como explicado a seguir: em junho do ano que vem, ao realizarem suas convenções, os partidos, na imensa maioria dos casos comandados por seus congressistas, organizarão suas listas de candidatos a deputados federais e estaduais colocando os atuais parlamentares nos primeiros lugares. Estes, os do topo da lista, sairão da Convenção para comemorar a eleição; os demais, bons que sejam, estão previamente derrotados. Três meses mais tarde, em outubro, nós, os bobos da corte, compareceremos aos locais de votação, onde somaremos nosso voto a uma lista qualquer para que assim, proporcionalmente, sejam definidas quantas cadeiras cabem a cada sigla, segundo aquela ordem de preferência que cada partido houver definido em junho.
Não se diga que há países civilizados que votam assim. Este é o país da Lava Jato, do foro privilegiado, onde criminosos legislam, governam e julgam. (Leia a íntegra do artigo aqui: http://zh.clicrbs.com.br/rs/opiniao/ultimas-noticias/tag/percival-puggina/)

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