domingo, 11 de setembro de 2016

Perdida na noite

PERDIDA NA NOITE

Num canto escuro de uma esquina malcheirosa, agarrada nos tijolos de um prédio sujo, ela vomitava. Suas pernas manchadas de bexigas roxas demonstravam a falta de cuidado que tinha para consigo. Um homem bêbado passou perto e disse alguns gracejos enquanto ela jogava fora sua existência, encharcada de álcool nas noites da vida. Após o pior passar ela levantou os olhos para o céu e viu a lua olhando para sua carcaça desalinhada. Por um breve momento pensou nos sonhos de menina que o diabólico tempo tratou de pulverizar. Tinha perdido o juízo; a juventude tão gostosa de ser vivida; os amigos verdadeiros; a família que ela mesma deixara para trás. Caminhou alguns quarteirões até seu quartinho acanhado no hotelzinho de quinta categoria. Abriu a porta e sentiu no rosto o cheiro de mofo que dominava o cubículo. Sentou-se na cama e acendeu mais um cigarro, talvez o trigésimo da noite. Tudo à sua volta rodava, os olhos de peixe morto, pálpebras caídas. Após fumar, apagou o venenoso e se deitou sobre o cobertor que  ansiava por limpeza. Apagou... Mais uma noite de trabalho encerrada, mais um dia vivido sem ter alegria no coração.

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