HOTEL DE OSSOS
É raro
conhecer um humano, ainda mais vivo que tenha prazer em dormir serenamente no
Hotel dos Ossos. Pois Melcíades era este homem, sempre fazendo apostas com os
amigos e conhecidos que pernoitaria sobre as geladas tampas de mármores das moradas
eternas. Entrava no hotel antes da meia-noite e saí às seis horas da manhã.
Ficava lá mais sozinho que um outrora rico quebrado. E assim por diversas vezes
fez apostas com diferentes pessoas, sempre vencendo e ganhando alguns trocados.
Nem mesmo noites de louca tempestade o faziam desistir; duelava sem trégua
contra raios e trovões. No Bar do Cide eram feitas provocações já com o
objetivo traçado e dali saíam às apostas que terminavam sempre nos bolsos de
Melcíades. No Hotel dos Ossos havia tumbas que traziam o desgaste provocado
pelo corpo do inabalável corajoso, ousado cavaleiro dormente e não raras vezes
também saltitante sobre repousos de mármore ou de tijolos sem alisamentos. Então
numa noite que todos ainda recordam nas conversas miúdas na praça de Belvedere,
nos botecos e nos chás de comadres, Melcíades entrou no cemitério valendo mais
uma aposta e na manhã seguinte não saiu. Nunca mais foi encontrado. Na mesma
noite sumiu a mulher do Cide. Até mesmo o Cide aposta que ela fugiu com ele.
Pelo jeito não é dó de ossos e apostas que Melcíades gostava.
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