quarta-feira, 6 de maio de 2015

Blog da Andrea Faggion- Nota sobre o ideal da igualdade de oportunidades

Se tem um conceito que o senso comum abraça com naturalidade é o de "igualdade de oportunidades" (não confundir com igualdade formal, que é a igualdade de todos perante a lei). Mas, se você pensa um pouquinho, já nota que tal coisa não apenas não existe como ainda é impossível de ser criada. Uma pessoa com um sorriso mais bonito, de acordo com os padrões de sua sociedade, já terá mais oportunidades. Só a total e completa aniquilação de todas as diferenças entre nós, incluindo até mesmo diferenças de localização no tempo e no espaço, igualaria as oportunidades. O simples fato de alguém ter estado no lugar certo na hora certa, enquanto o outro não estava, já pode mudar tudo entre eles. É a descoberta desse fato que faz o defensor da igualdade de oportunidades passar a defender uma espécie de sistema de multas e compensações. O que teve mais sorte será coagido a indenizar o que teve menos sorte.
Ora, naturalmente, só saberemos quem teve mais ou menos sorte conforme os resultados. Como saber a priori qual era o lugar certo e a hora certa, por exemplo? Mas, então, como sabermos o quanto do resultado se deve à sorte e o quanto se deve ao mérito para sabermos o quanto o sortudo deve pagar por sua sorte? Como sabermos se outro, no mesmo lugar naquele mesmo tempo, teria aproveitado a oportunidade da mesma forma, para sabermos que ele merece ser indenizado por não ter tido aquela oportunidade? Não ser do tipo que aproveita oportunidades já é um azar genético e ambiental? O que faz muito com poucas oportunidades já é um privilegiado pela genética? Pode ser.
O fato é que, mesmo que reduzamos todas as diferenças de resultados a diferenças de oportunidade de um tipo ou outro, eu ainda não entendo por que o sortudo deveria indenizar o azarado sem ter tirado nada dele. O sortudo não mereceu a oportunidade. Mas ele também não a roubou! Por que ele teria que reparti-la? É essa a grande questão que o defensor da igualdade de oportunidades precisa responder, sem pedir o princípio da igualdade, que é justamente o que se questiona.
Simplesmente apontar o suposto fato de que certos grupos sociais ou tipos de indivíduos teriam mais facilidades de ascensão por meio do trabalho voluntário não prova, primeiro, que tentativas de equilibrar o jogo por meio de intervenções de força não teriam resultados desastrosos para seus próprios fins e, segundo, que, mesmo se pudéssemos contar com a eficácia das intervenções de força, elas seriam moralmente legítimas. Não é auto-evidente que alguém que não tenha tirado algo de outrem tenha algo a lhe restituir. O ideal da igualdade como princípio de justiça distributiva é um pressuposto que pede por uma justificativa.

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