segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

ORDEM LIVRE-Terror e Pão e Circo

Com grandes responsabilidades vêm grandes poderes. Toda vez que se debate a criação de uma lei ou agência, pense no seguinte: o que meu pior inimigo faria se fosse dono desse novo poder? Considere a Lei Antiterrorismo.
O PLS 499 tipificaria como terrorismo “provocar ou difundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”. Agora, se você é fã do Jean Wyllys, pense no estrago que um Jair Bolsonaro poderia fazer com uma lei dessas. E se você é fã do Bolsonaro, imagine o que poderia ser a sanha antiterrorista de um Jean Wyllys?
O problema fundamental é que terror e pânico são reações emocionais, e um estado psicológico não deve tipificar um fato gerador de efeitos jurídicos. Terrorismo é um negócio tão vago que o Manual Routledge lista mais de 260 diferentes definições de terrorismo empregadas ao redor do mundo. A ONU está desde o ano 2000 sem conseguir efetivar a Convenção de Terrorismo Internacional porque não há acordo sobre o que constitui ação terrorista. Como eu disse em matéria para o Instituto Millenium:
Caso seja aprovado pela euforia de políticos querendo exibir preocupação póstuma, o PLS 499 corre o risco de virar um curinga nas mãos de governos e tribunais empoderados para punir de acordo com suas preferências.
Não é impensável que no futuro acusem até jornalistas de terrorismo e queiram remover concessões de rádio e televisão de quem desafie o poder.
O legislativo brasileiro funciona na base da saída Bangu. Cada vez que a sociedade testemunha um crime de grande proporções - um prédio que desaba, um bueiro que explode, uma boate que pega fogo, uma criança que é assassinada - os políticos aproveitam para ganhar popularidade aparecendo na TV com alguma saída ad hoc de custo zero que não resolve o problema. Se caneta de senador bastasse para impedir o crime, o congresso não andaria de carro blindado.
Do que adianta mudanças no código penal enquanto a taxa de homicídios não resolvidos no Brasil fica entre 92% e 95%? Pense nisso. Se um criminoso pegar um revólver com tambor de seis munições e decidir fazer roleta russa com a cabeça de outra pessoa, a chance da vítima morrer é o dobro da chance do assassino ser pego. É estatisticamente mais fácil um homicida fugir da polícia do que uma empresa fugir da receita.
Não é preciso fazer uma lei para cada instrumento de agressão, cada biótipo da vítima, nem cada motivação psicológica do agressor. A África do Sul conseguiu realizar uma Copa sem grandes sustos com patrulhamento visível, equipes policiais de resposta rápida, tecnologia de segurança e eficiência nos tribunais. Nossas leis criminais podem ser brandas ou ineficazes, mas criar novas leis brandas e ineficazes não resolve o problema, apenas deixa a legislação ainda mais diluída, e o poder político mais arbitrário.
O Brasil já vive em estado constante de terror. Todo homicídio noticiado contribui para provocar terror e pânico em um país com mais de 40 mil homicídios por ano.


Autor


Diogo Costa

Diogo G. R. Costa é professor de relações internacionais no Ibmec-MG e Presidente do Instituto Ordem Livre.

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