segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Yoani Sánchez- Bullying em Cuba ?

Damaris tem quase quarenta anos e várias cicatrizes no rosto. Feitas por uma colega do quinto grau com um pregador de cabelo. Estavam em meio a uma aula e a disputa pela propriedade de um estojo de lápis levou a inimiga a gritar: “Te espero às quatro e meia!”. Essa é a pior ameaça que um estudante das escolas cubanas pode receber. A frase é suficiente para saber que na hora da saída terá que mostrar força e supremacia com punhos ou arranhões.
Com Yosniel foi pior. Jogou-se da caixa d’água do curso pré-universitário República Popular da Romênia depois de sofrer por meses com os deboches dos seus colegas de albergue pelo tamanho da sua cabeça. Caiu sobre o concreto da tampa da cisterna e nenhuma manobra de reanimação pôde salvá-lo. No outro dia, durante o funeral, os próprios alunos que o ridicularizavam davam pêsames a família do falecido no paupérrimo bairro de Romerillo.
Contudo, o problema toca tanto os pobres como os mais acomodados. O metal frio de uma navalha atravessou o coração de Adrián, também num pré-universitário, porque outro mais forte gostou dos seus sapatos e quis tomá-los. Os pais do falecido eram militares, porém mesmo assim não conseguiram entender por que as escolas onde deveria ser formado “o homem novo” acabaram funcionando com o mesmo banditismo das prisões.
Cecília, por seu lado, sempre foi das que bateu… Não das que se deixaram bater. Escolhia a saia do uniforme que vestiria examinando a situação das estudantes mais frágeis ou menores. Um dia encontrou o modelo do seu sapato numa menininha magrinha de dentes separados que – com uma lâmina improvisada a partir de uma serrinha – cortou-lhe o rosto de lado a lado.
O abuso escolar, o bullying, é um tema pouco falado nos meios nacionais, mas que afeta centenas, milhares de estudantes em todo o país. Entre as características mais alarmantes deste problema está a cumplicidade de parte dos professores. Muitas vezes os professores se valem destes “tipos de gente dura” para controlar o resto dos alunos. O resultado é a validação institucional de uma estrutura de arrogância e abuso.
Como denunciá-lo? Ninguém sabe. Não há um número telefônico que um aluno vítima de bullying possa usar. Nenhuma circular do Ministério da Educação ampara os prejudicados nestes casos. Os pais, normalmente, respondem as denúncias de abusos contadas por seus filhos com um: “dá-lhe mais duro” ou “mostre-lhes quem és tu”. Os professores não querem se imiscuir na bronca e muitos diretores de centros escolares respondem na defensiva: “Imagina, já não sabemos o que fazer com este garoto”.
O certo é que o drama do abuso escolar não é falado, não é debatido e não é questionado… Enquanto as tantas Cecílias que existem por aí continuam tomando o uniforme das menores, cortando o rosto de uma colega de sala com um grampo ou zombando – até ao suicídio – do tamanho da cabeça de outro.
Tradução por Humberto Sisley

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