sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Caio Blinder- O ar de Bush (o pai)

O Obama do discurso de quarta-feira da estratégia do combate ao grupo terrorista Estado Islâmico não é mais o velho Obama que subiu na vida pontificando contra “guerras estúpidas”. Ele desceu para a realidade e como predecessores “vai estender o legado da guerra”, na expressão do New York Times. No discurso, o presidente manteve distância do caubói George W. Bush, mas ele tinha o tom, a retórica e a estratégia Bush, do Bush pai.
Marc Bassets, do jornal espanhol El País, traça um bom paralelo entre o empenho do democrata Obama para forjar uma coalizão internacional em 2014 contra o terror com o paciente trabalho do ex-presidente republicano George H.W. Bush contra Saddam Hussein em 1991, na primeira guerra do Golfo Pérsico. Bom lance de Obama. Afinal, como regressar ao Oriente Médio sem parecer George W. Bush? Inspirando-se no pai dele, que governou apenas entre 1989 e 1993, pois teve negado um segundo mandato ao ser derrotado pelo democrata Bill Clinton.
Como lembra Bassets, Bush pai costurou uma das maiores coalizões da história para enxotar Saddam Hussein do Kuwait. No entanto, ele deixou o ditador iraquiano escapar vivo. Saddam apenas encontrou a morte depois da invasão americana do Iraque, desfechada pelo filho. George W. exerceu o poder de forma mais impaciente e menos cerebral do que o pai. Ele  dividia o mundo entre amigos e inimigos e vislumbrava os EUA como capazes de mudar o eixo da história do Oriente Médio. Bush pai foi cauteloso até no processo de desmanche do comunismo soviético no final da Guerra Fria.
Bush filho era impulsionado por neoconservadores que esposavam o idealismo da política externa americana, com o uso de força para promover a democracia e os direitos humanos. Já o pai cauteloso era avesso ao aventureirismo e adepto da escola do realismo, a Realpolitik. O papel americano era zelar por seus interesses e participar de um jogo de equilíbrio de poderes. Obama fala em equilíbrio estratégico no Oriente Médio e cogita até de trazer o Irã dos aiatolás para o cenário desde que regulem o seu programa nuclear.
Bush pai não era avesso à guerra (e para ele não se tratava de algo abstrato, pois combateu na Segunda Guerra Mundial). A mesma coisa com Obama (sem experiência militar), que nunca deve ser confundido com um pacifista. Bush pai, no entanto, sempre foi mais internacionalista do que Obama, que teve a ilusão de que poderia colocar as coisas na mochila e voltar para casa, com o projeto de fazer reformas domésticas.
Nada garante que a armação de Obama funcione agora. As coisas hoje são mais incertas do que nos tempos em que Bush pai armou a sua coalizão, com o objetivo limitado de punir Saddam por sua invasão do Kuwait. O inimigo terrorista hoje em dia é mais difuso e há ambiguidades na postura dos aliados árabes que começam a cerrar fileiras. Os sauditas, por exemplo, parecem mais empenhados em enxotar o ditador Bashar Assad do poder do que, por exemplo, enviar tropas para a Síria para derrotar o Estado Islâmico. Em comum, Bush pai e Obama prezam a aliança com os sauditas.
No entanto, como observa Bassetts, a sombra de Bush filho persegue Obama. O terror islâmico agora é assumidamente seu grande inimigo  como foi no caso do seu antecessor. O presidente atual nunca escondeu sua admiração pelo estilo cerebral e realista de Bush pai. E agora existe a conveniência política de regressar ao Oriente Médio, recorrendo ao seu estilo e evocando as suas ideias. Quem diria, um filho político. E, é claro, se tudo der errado, sempre haverá um Bush para ser culpado.
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