terça-feira, 19 de agosto de 2014

Entre a fome do povo e as fortunas dos amigos do poder


Socios-desaparecido-Chavez-Nicolas-MaduroAP_CLAIMA20140817_0021_27Traduzo abaixo a ótima matéria publicada neste domingo no jornal argentino El Clarín, que retrata o socialismo como ele é: escassez para o povo e fortuna para os amigos do poder. É isto que os socialistas bolivarianos brasileiros, parceiros do governo venezuelano no Foro de São Paulo, já estão fazendo com o nosso país.
Comento mais em breve.
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O capitão aposentado do exército venezuelano William Biancucci caminha por seu escritório sem muita mobília em Caracas, segurando um exemplar vermelho encadernado da constituição socialista de Hugo Chávez. Ele está discutindo seus planos para comprar um avião particular e viajar com conforto para a sua fazenda na Amazônia, no Brasil. A partir de uma ampla faixa de terra com pastos, fretou milhares de vacas em barcos para a Venezuela.
Biancucci, de 55 anos, que cresceu na pobreza, diz que obteve contratos de fornecimento de gado para a Venezuela através de sua amizade com oficiais militares que estão atualmente no governo. Sua voz fica carregada de emoção ao dizer que tem sido um admirador de Chávez desde a escola militar. Em 1992, ele se juntou a 140 outros oficiais na tentativa de golpe liderada por Chávez. Embora a tentativa tenha fracassado, Chávez foi eleito presidente seis anos depois e os negócios de Biancucci prosperaram.
O socialismo é a solução para a pobreza, diz Biancucci. No seu caso, o socialismo de Chávez o tornou rico, diz ele. “Sou socialista, mas eu gosto de ter notas de dinheiro em minhas mãos”, diz ele, sacudindo o punho com um maço de notas imaginárias. “Socialismo é riqueza.”
Biancucci pertence a um círculo de venezuelanos íntimos de Chávez que adquiriram riqueza durante seus 14 anos no poder e com seu sucessor, o ex-motorista de ônibus e líder sindical, Nicolás Maduro. As empresas desses homens de negócios receberam bilhões de dólares do governo para a distribuição de alimentos, serviços bancários e outras atividades. Alguns dos que se beneficiaram fazendo negócios com o Estado vivem em mansões de luxo, são donos de haras na Flórida, viajam em avião privado e jogam pólo.
Mas a Venezuela é uma economia falida. Escasseiam produtos como carne, farinha de trigo, plásticos, peças de automóveis e até mesmo água. A inflação anual chegou a 61%, a mais alta entre 122 países monitorados pelo Bloomberg [um dos principais provedores mundiais de informação para o mercado financeiro]. A eclosão de homicídios na Venezuela, estimados em 24.763 no ano passado e o dobro desse número há uma década, deixou vazios teatros vazios e clubes de salsa que antigamente ficavam lotados. “A Venezuela passou por muitas crises no passado”, diz Harold Trinkunas, pesquisador do Instituto Brookings, em Washington. “Mas nada alcançou a magnitude do que vemos hoje”, acrescenta.
Na Venezuela, a economia é dirigida por oficiais militares, e seus interesses comerciais e do governo estão interligados. Oficiais da ativa ou aposentados ocupam um quarto dos 31 cargos de nível ministerial, incluindo os Ministérios de Finanças, Energia, Alimentos e Interior.
Chávez, que morreu no ano passado, prometeu usar a riqueza do petróleo para ajudar os pobres e gerar prosperidade e equidade. Confiscou cerca de 1.200 fazendas, lojas e fábricas. Mas Chávez, e em seguida Maduro, também tornaram ricos alguns de seus amigos à base de contratos com o governo.
Uma área onde os privilegiados de Chávez tem imenso poder é a distribuição de alimentos. Mais de 20.000 lojas do Estado devem fornecer produtos básicos baratos como arroz, leite e carne. Chávez começou a construir esta rede em 2003, levando 40 bilhões de dólares por ano em receitas das exportações de petróleo.
Apesar deste financiamento, em maio a produção de carne caíra 36% em relação a 2013, de acordo com a Associação Venezuelana de Frigoríficos. Além disso, os trabalhadores deixaram as fazendas e chácaras que Chávez havia confiscado devido a controles de preços e falta de insumos. Em janeiro, escasseava mais de um em cada quatro produtos básicos, segundo o Banco Central. O sistema estatal de alimentos tem sido atormentado com deficiências, uma contabilidade frouxa e falta de auditoria e supervisão, conforme demonstrado pela Controladoria-Geral da República em abril.
Em 2008, Chávez criou a PDVAL, uma unidade da companhia petrolífera estatal, para percorrer o mundo a fim de comprar alimentos. Em poucos meses, centenas de recipientes com carne, frango, macarrão e leite foram abandonados ou deixados apodrecendo no calor tropical, devido à negligência do governo em Puerto Cabello, o maior do país. O sistema deficiente de distribuição da Venezuela frustra a população enquanto enriquece as pessoas com ligações políticas, diz Neidy Rosal, representante do estado Carabobo. “Muitos estão ganhando dinheiro com o desespero das pessoas por comida”, diz ele. “Eles estão usando a fome e o acesso aos alimentos para ficar ricos. É uma desgraça.” Mas, segundo Biancucci, que está no ramo da carne, quando os militares tiverem um maior controle, o problema da má gestão e da escassez será resolvido. “Todo mundo no setor de alimentos é aposentado militar. Isso ajuda porque garante a disciplina, a ordem “, diz ele.
Biancucci foi prestador de serviços para empreiteira antes de entrar no negócio de alimentos com o governo Chávez. Ele começou seu negócio no Brasil, onde comprou uma fazenda perto de Belém. Carrega seu gado em barcos em Vila do Conde, no delta do Amazonas. “Eu posso carregar até 5.000 vacas por mês a partir das minhas terras”, diz o empresário e ex-soldado, vestindo uma jaqueta safári de manga curta sobre uma camisa vermelha como as que Chávez usava.
Até o ano passado, de acordo com registros do Ministério da Agricultura do Brasil, a empresa Biancucci, Portal do Boi Representaäes Comercio Ltda., havia adquirido duas fazendas perto de Belém. Portal do Boi e outra empresa controlada pelo mesmo empresário, International Trading Thawi CA, exportaram um valor de até 110 milhões de dólares para a Venezuela de 2009 a 2011, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do Brasil.

madurochavez980
Felipe Moura Brasil ⎯ http://www.veja.com/felipemourabrasil

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