domingo, 31 de agosto de 2014

Caio Blinder- Será que o histerismo é razoável na crise ucraniana?

Como a própria Anne Applebaum reconhece, o tom de suas reflexões pode soar histérico ou apocalíptico, mas, se ela decidiu compartilhar seu sobressalto, eu embarco nessa, pois a jornalista e escritora americana (casada com Radosław Sikorski, ministro das Relações Exteriores da Polônia) é para mim uma voz importante em assuntos relacionados à Rússia e à Europa Oriental. Na verdade, ela ecoa os sobressaltos da Europa Oriental, que viveu tanto tempo sob jugo soviético, além de amargar o nazismo, e trata o fator Putin com muito mais inquietação (histerismo?) do que os primos ocidentais.
Anne Applebaum alinha os motivos para cogitar de histerismo: nos últimos dias, tropas russas que cruzaram a fronteira ucraniana (tudo negado pela agitprop) carregavam a bandeira de um país desconhecido, a Novorossiya, Nova Rússia, que são as reinvidicações históricas do império czarista sobre territórios do sudeste ucraniano e com um sentido cada vez mais flexível.
A Academia de Ciências da Rússia anunciou que vai publicar uma história da Novorossiya em breve, remontando suas origens aos tempos de Catarina, a Grande. Há mapas da Novorossiyacirculando em Moscou, alguns incluem cidades no leste ucraniano que ainda não conheceram combates na atual guerra civil, seguida de invasão russa. O próprio Putin voltou a usar o termo na quinta-feira ao saudar milicianos.
Existe, de fato, uma conversa apocalíptica em Moscou. Alexander Dugin, um guru do nacionalismo extremo, não mede palavras. Ele vocifera a favor de uma “limpeza de idiotas” na Ucrânia” e o “genocídio de  uma raça de bastardos”. Seria meramente folclórico, embora aterrador, caso o Kremlin não desse ouvidos a Dugin.
Outro alucinado, Vladimir Zhirinovosky, argumentou na televisão que a Rússia deveria usar armas nucleares na Polônia e nos países bálticos, “estados anões”. Talvez bravatas de lunáticos, mas, na sexta-feira, falando a jovens em um acampamento de verão, Putin lembrou que a Rússia “é um poderoso país nuclear”.
Anne Applebaum divaga e viaja para os idos de 1939, para os tempos de Stálin e Hitler, quando a retórica era insana, mas as promessas de déspotas foram cumpridas. A preocupação de Anne Applebaum é que no momento ninguém se mostra preparado para deter Putin. Ela termina sua reflexão sombria e confusa com duas perguntas: será histérico se preparar para guerra total? Ou será ingênuo não fazer isso?
O último lance de “determinação” da União Europeia foi fixar na madrugada deste domingo um ultimato de uma semana para a Rússia reverter o curso na Ucrânia. Em caso contrário, será formulada uma nova lista de sanções (boicotar a Copa de 2018 na Novorossiya seria uma meta, um goal, razoável). Esta tem sido a dinâmica da crise até agora. Moscou avança, negando tudo em uma pantomina cada vez mais inverossímil, e Bruxelas a duras penas adota sanções em meio as divisões internas entre os 28 países-membros da União Europeia.
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