domingo, 22 de junho de 2014

Janer Cristaldo-A COPA E A AMEAÇA ARGENTINA

Charles Pilger, gaúcho, escreve no FB:

“O que mais me entristece nessa história das gurias fazendo a festa com os turistas que aparecem na cidade é o fato de que parece que não houve uma revolução sexual a 50 anos atrás. Oi? Como assim só homem pode se divertir? Como assim a garota que pega um belo holandês é vadia e o cara que pega uma australiana é garanhão? Sério que isso ainda existe?”

Existiu, existe e sempre vai existir, Pilger. Enquanto o macho domina, só o macho tem direito à uma vida sexual livre. Se a mulher ousa tomar a mesma atitude, é puta e mais não se discute. Verdade que os tempos mudaram, e hoje, apesar de ser considerada puta, a mulher é aceita com suas putices e tudo em todos os meios sociais. Mas sempre fica a pecha. O gaúcho sempre vai preferir, para mulher de seus filhos, uma mulher casta e fiel. Se quer um sexo mais divertido, procura as putas.

Verdade que hoje não mais se exigem virgens no casamento. Mas como seria bom... Mas, uma vez casada, a mulher que se comporte. Isso de vida sexual farta continua sendo privilégio do marido. 

Enquanto isso, pelo menos às solteiras é permissível a vida folgada. Nem poderia ser diferente. Depois dos anos 60, ficou difícil de controlar a vida sexual das moças. 

A pílula libertou as mulheres do maior receio, a gravidez acidental. Antes disso, os prédios e os automóveis haviam dado sua contribuição à libertação sexual. Se em uma cidade pequena se podia controlar a vida das aldeãs, o mesmo não era possível numa cidade com prédios de dezenas de apartamentos e carros. A mulher entrava num carro e ninguém ficava sabendo para onde ia. Entrava num prédio e ninguém sabia quem ia visitar. 

Vivi a Porto Alegre dos 70. Fui gravateado em bares e arrastado para a cama. Na rua ou no elevador, bastava um olhar mais eloqüente e dispensava-se quaisquer palavras. A Aids pode ter sido uma ducha de água fria para os mais entusiastas, mas foi algo contornável. Exorcizado o mal, logo se voltou ao bom esporte.

“E o que temos com essa história? – pergunta-se Pilger. “Mais uma prova do quão provinciana a mui leal e valorosa cidade de Porto Alegre é. O que os homens da cidade não estão entendendo é que com a Copa a cidade está passando dias de Rio de Janeiro, onde as mulheres podem ser sexualmente livres e não tem que aguentar fofoquinha e dedos apontados no dia seguinte...”

Os tempos podem ter mudado, Pilger. Mas o resíduo de machismo permanece. Até mesmo quando a mulher traz o de comer para casa. E não é só gaúcho. Isso de marido matando mulher, namorado matando namorada, se repete no país todo. Só nos últimos dias, ocorreram três ou mais casos. É a falência do macho, que eu comentava já nos anos 70. (Segue a crônica abaixo).

Quanto às gaúchas... sempre é bom trocar de cardápio. Naqueles mesmos anos 70, escrevi crônica na Folha que teve repercussão enorme e inesperada. Lembrei de duas ou três amigas que costumavam ir ao Rio em férias e voltavam sideradas. Eu estava sem assunto e generalizei. Escrevi crônica intitulada “As gaúchas e o Rio”.

O gaúcho nada entendia de mulher. Quem entendia era o carioca. O gaúcho era um bruto. O carioca, um princípe. O gaúcho era possessivo. O carioca, um liberal. O que as gauchinhas não se davam conta era que os amores de verão duravam o que duram as rosas. Não havia tempo para entediar-se, nem sequer para conflitos. Voltavam apenas com boas lembranças, já que as más nem tiveram tempo de ocorrer.

Aproveitei ainda para publicar pesquisa feita entre as cariocas que diziam que o carioca... era um bruto. Claro, as moças tinham de agüentar os conterrâneos o ano todo. As gaúchas, só o verão.

Pra quê, meu Deus! A redação foi inundada de telefonemas, de moças alegando que não era por isso que elas iam ao Rio. Ora, no “isso” eu nem havia falado. Sem sequer imaginar no formigueiro que havia mexido, descobri um fluxo subterrâneo no Portinho. Hoje, não é preciso mais ir ao Rio. Em Porto Alegre mesmo se pode aplacar os ardores. Continua Pilger:

“E é aquilo: se queriam mulherada vindo para a cidade que apoiassem outro evento, não uma Copa do Mundo! Chamam um bando de macho e depois reclamam? Oras!”

Mas talvez não seja bem isso, Pilger. E sim a proximidade do jogo da Argentina no Beira-Rio. Os porto-alegrenses nunca olharam com bons olhos nuestros vecinos. Perder uma percanta para um hincha de allá deve doer mais que perder a Copa.

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