segunda-feira, 30 de maio de 2016

Mentiras da Igreja Católica- Por Pepe Rodriguez

Capítulo I

COMO A IGREJA CATÓLICA 
 INTERPRETOU DE FORMA INTERESSADA O NOVO TESTAMENTO PARA PODER 
IMPÔR SUA VONTADE ABSOLUTA SOBRE 
O POVO E O CLERO

A hermenêutica bíblica atual garante absolutamente a tese de que Jesus não instituiu praticamente nada e menos ainda qualquer modelo determinado de Igreja. Pelo contrário, os textos do Novo Testamento oferecem diversas possibilidades na hora de estruturar uma comunidade eclesial e seus ministérios sacramentais1.
Segundo os Evangelhos, Jesus só citou a palavra «igreja» em duas ocasiões e em ambas se referia à comunidade de crentes, jamais a uma instituição atual ou futura. Mas a Igreja Católica empenha-se em manter a falácia de que Cristo foi o instaurador de sua instituição e de preceitos que não são senão necessidades jurídicas e econômicas de uma determinada estrutura social, conformada a golpes de decreto no decorrer dos séculos.
Assim, por exemplo, instituições organizativas como o episcopado, o presbiterado e o diaconato, que começaram a formar-se nos fins do século II, foram defendidas pela Igreja como dadas “por instituição divina”(fundadas por Cristo)2, até que no Concílio de Trento, em meados do século XVI, foi mudada habilmente sua origem e passaram a ser «por disposição divina» (por arranjo, por evolução progressiva inspirada por Deus). E, finalmente, a partir do Concílio Vaticano II (documentos Gaudium et Espes, e Lumen Gentium), na segunda metade do século XX, a estrutura hierárquica da Igreja já não tem suas raízes no divino senão que procede “do antigo” (é uma mera questão estrutural que se tornou costume).
São muitas as interpretações errôneas dos Evangelhos que a Igreja Católica realizou e sustentou veementemente ao longo de toda sua história. Erros que, em geral, devem atribuir-se antes à malícia e ao cinismo e não à ignorância - nada depreciável, por outro lado -, já que, não por acaso, todos eles resultaram imensamente benéficos para a Igreja em seu afã de acumular dinheiro e poder. Mas neste capítulo vamos ocupar-nos só de duas mistificações básicas: a que corresponde ao conceito da figura do sacerdote e a que transformou o celibato numa lei obrigatória para o clero.
Os fiéis católicos levam séculos crendo de olhos fechados na doutrina oficial da Igreja que apresenta o sacerdote como um homem diferente dos outros - e melhor que os laicos -, “especialmente eleito por Deus” através de sua vocação, investido pessoal e permanentemente de sacro e exclusivo poder para oficiar os ritos e sacramentos, e chamado para ser o único mediador possível entre o ser humano e Cristo. Mas esta doutrina, tal como sustentam muitos teólogos, entre eles José Antonio Carmona3, nem é de fé, nem tem suas origens além do século XIII ou finais do XII.
A Epístola aos Hebreus (atribuída tradicionalmente a São Paulo) é o único livro do Novo Testamento no qual se aplica a Cristo o conceito de sacerdote – hiereus -4 , mas se emprega para significar que o modelo de sacerdócio levítico já não faz sentido a partir de então. “Tu [Cristo] és sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedec - se diz em Heb 5,6 -, não segundo a ordem de Aarão”.
Outros versículos - Heb 5,9-10 e 7,22-25 - também deixam assentado que Jesus veio a abolir o sacerdócio levítico, que era tribal - e de casta (pessoal sacro), dedicado ao serviço do templo (lugar sacro) para oferecer sacrifícios durante as festas religiosas (tempo sacro) -, para estabelecer uma fraternidade universal que rompesse a linha de poder que separava o sacro do profano5. E em textos como o Apocalipse - Ap 1,6; 5,10; 20,6 -, ou a I Epístola de São Pedro - IPe 2,5 - o conceito de hiereus/sacerdote já se aplica a todos os batizados, a cada um dos membros da comunidade de crentes em Cristo, e não aos ministros sacros de um culto.
A concepção que a primitiva Igreja cristã tinha de si mesma - ser “uma comunidade de Jesus”- foi amplamente ratificada durante os séculos seguintes. Assim, no Concílio de Calcedônia (451), seu cânon6 era taxativo ao estipular que “ninguém pode ser ordenado de maneira absoluta –apolelymenos - nem sacerdote, nem diácono (...) se não lhe foi atribuído claramente uma comunidade local”. Isso significa que cada comunidade cristã elegia um de seus membros para exercer como pastor e só então podia ser ratificado oficialmente mediante a ordenação e imposição de mãos. O contrário, que um sacerdote lhes viesse imposto desde o poder institucional como mediador sacro, é absolutamente herético6 (selo que, estrito sensu, deve ser aplicado hoje às fábricas de curas que são os seminários).
Nos primeiros séculos do cristianismo, a eucaristia, eixo litúrgico central desta fé, podia ser presidida por qualquer varão - e também por mulheres - mas, progressivamente, a partir do século V, o costume foi cedendo a presidência da missa a um ministro profissional, de modo que o ministério sacerdotal começou a crescer sobre a estrutura sócio-administrativa que se denomina a si mesma sucessora dos apóstolos - mas que não se baseia na apostolicidade evangélica e muito menos na que propõe o texto joanino - em lugar de fazê-lo a partir da eucaristia (sacramento religioso). E daquelas poeiras vêm as atuais lamas.
No Concílio III de Latrão (1179), que também pôs os alicerces da Inquisição, o papa Alexandro III forçou uma interpretação restringida do cânon de Calcedônia e mudou o original titulus ecclesiae -ninguém pode ser ordenado se não é para uma igreja concreta que assim o demande previamente - pelo beneficium - ninguém pode ser ordenado sem um benefício (salário da própria Igreja) que garanta seu sustento-. Com este passo, a Igreja traía absolutamente o Evangelho e, ao priorizar os critérios econômicos e jurídicos sobre os teológicos, dava o primeiro passo para assegurar para si a exclusividade na nomeação, formação e controle do clero.

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